Participantes de audiência defendem repasse de R$ 257 milhões para clínicas de diálise durante pandemia

18/06/2020 – 19:17  

Gustavo Sales/Câmara dos Deputados

Os Pacientes Renais e as Clínicas de Hemodiálise na Pandemia. Dep. Carmen Zanotto (CIDADANIA - SC), dep. Dr. Luiz Antonio Teixeira Jr. (PP - RJ) e dep. Antonio Brito (PSD - BA)

A comissão externa de ações contra o novo coronavírus debateu em videoconferência a situação das clínicas de hemodiálise durante a pandemia

Participantes de uma videoconferência que discutiu a situação dos pacientes renais e das clínicas de hemodiálise durante a pandemia de Covid-19 foram unânimes em defender a aprovação, pela Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei 2270/20, que prevê o repasse de R$ 257 milhões da União para os estabelecimentos de diálise que atuam de forma complementar no Sistema Único de Saúde (SUS).

Pela proposta, da deputada Carmen Zanotto (Cidadania-SC), os recursos custeariam os primeiros quatro meses da pandemia, de 15 de março a 15 de julho. “O PL 2270 busca dar aos serviços de terapia renal uma condição similar à que foi dada aos hospitais e às Santas Casas. Eles também estão com gasto extra de EPI [equipamento de proteção individual], estão tendo que afastar trabalhadores de risco e contratar profissionais substitutos”, afirmou a parlamentar na reunião da comissão externa que acompanha as ações de combate ao novo coronavírus, da qual é relatora.

Coautor do projeto, o deputado Antonio Brito (PSD-BA) destacou a importância de debater o assunto, tal a gravidade do impacto do custo da pandemia nas clínicas de diálise. “Vamos articular para que esse projeto entre logo em pauta”, afirmou.

Atualmente no Brasil cerca de 140 mil pessoas realizam três sessões de diálise por semana, em cerca de 800 clínicas, com duração média de quatro horas por sessão.

Problemas


Na reunião, médicos, pacientes e representantes de secretarias de saúde expuseram a situação da hemodiálise no País. O presidente da Associação Brasileira dos Centros de Diálise e Transplante (ABCDT), Marcos Alexandre Vieira, disse que alguns problemas que eram crônicos “floresceram de maneira mais substancial agora”.

Vieira reclamou do atraso no repasse de recursos para a prestação do serviço em unidades do Amazonas, por exemplo, e também defendeu reajustes na tabela do Sistema Único de Saúde (SUS). “Nos últimos oito anos, tivemos 54% de inflação. A sessão de diálise precisaria custar R$ 263, mas hoje ela custa R$ 194”, comparou.

Odair Leal/Governo do Acre

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Atualmente no Brasil cerca de 140 mil pessoas realizam três sessões de diálise por semana

Na opinião do vice-presidente da Sociedade Brasileira de Nefrologia, Daniel Calazans, o Brasil precisa redesenhar seu modelo de tratamento de pacientes renais crônicos, ainda que o problema emergencial seja o financiamento. “Precisamos repensar a forma de prevenção [das doenças renais]”, defendeu. Caso contrário, o que acontece, disse, é uma luta por aumento de recursos, que logo depois são consumidos pela inflação.

Marcos Alexandre Vieira destacou ainda que não existirá “pós-Covid” nas clínicas de diálise, que sobreviverão com dificuldades por muito tempo, já que diversos transplantes deixaram de ser realizados em algumas regiões em razão da pandemia, o que sobrecarrega ainda mais o sistema.

O diretor substituto de Atenção Especializada e Temática do Ministério da Saúde, Marcio Irita Haro, explicou que os assuntos relativos aos pacientes renais são tratados com muita atenção pela pasta.

“Inclusive, ano passado já estávamos trabalhando em uma análise multifatorial, buscando ações efetivas para atender essas pessoas de maneira mais eficiente. Infelizmente, com a pandemia, as atividades tiveram de ser interrompidas”, relatou. Uma linha de trabalho do ministério diz respeito ao fortalecimento da atenção primária, a fim de evitar que pessoas hipertensas ou diabéticas se tornem dialíticas.

Pacientes


Da parte dos pacientes, a rotina é de sofrimento. “Temos pacientes que levam quatro horas para chegar ao tratamento, quatro horas na sessão e mais quatro para retornar para casa. O transporte é inadequado. Os pacientes estão se contaminando nesse transporte”, descreveu o diretor de comunicação da Federação Nacional das Associações de Pacientes Renais e Transplantados do Brasil (Fenapar), Humberto Floriano Mendes.

A deputada Mariana Carvalho (PSDB-RO) relatou que, em Rondônia, pacientes renais morreram de Covid-19, depois de se contaminar no trajeto de Guajará-Mirim para a capital, Porto Velho. “Nós que somos da região Norte sofremos muito. Em muitos municípios, não temos condições de fazer com que a diálise ocorra”, lamentou a parlamentar.

Média de valores


A Lei 13.992/20, que suspende por 120 dias, a contar de 1º de março de 2020, a exigência de metas quantitativas e qualitativas estabelecidas em contratos de prestadores de serviços no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), também foi discutida na audiência. A regra mantém o pagamento da produção do Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (Faec), com base na média dos últimos 12 meses. Os repasses do fundo ocorrem normalmente após a apuração da produção dos estabelecimentos de saúde.

A reclamação de participantes da audiência é que, em razão do aumento dos custos das clínicas de diálise durante a pandemia, o repasse de recursos não pode se dar pela média de valores anteriores.

Segundo o consultor técnico do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) Leonardo Vilela, a expectativa é que de março a junho haja um déficit de R$ 30 milhões em relação à terapia renal substitutiva, por exemplo. Por outro lado, Vilela defendeu também a aprovação do PL 3058/20, do deputado Pedro Westphalen (PP-RS), que prorroga a vigência da Lei 13.992/20 até o fim do ano.

“É preciso estabelecer um dispositivo no PL 3058 para que o pagamento da produção excedente possa ser feito sem deixar os gestores de saúde condenados”, disse Vilela, em referência à prestação de contas que gestores têm de fazer.

Marcio Haro, do Ministério da Saúde, cogitou a possibilidade de um remanejamento de recursos de prestadores que prestaram menos serviços para outros que prestaram muito mais, caso das clínicas de hemodiálise. “Houve um balanço positivo em torno de R$ 60 milhões repassados para cirurgias eletivas que não foram executadas. Acreditamos que seja possível estudar medidas para remanejamento desses recursos e aportes adicionais, caso seja factível”, disse.

Reportagem – Noéli Nobre

Edição – Roberto Seabra