Sobrevivência

Guerra em Israel: um povo que mata para não morrer

É difícil para qualquer um entender o que é sentir medo apenas por andar na rua

O pequeno Ezra Yachin nasceu em Jerusalém, capital da Palestina. Viu o nazismo, a Segunda Guerra Mundial e lutou no conflito que levaria à fundação do Estado de Israel, em 1948. Hoje, ele é o reservista mais velho do exército israelense, convocado para mais uma guerra aos 95 anos de idade. 

É difícil para qualquer um entender o que é sentir medo apenas por andar na rua, como foi o início da vida de Ezra e a maior parte da história do povo judeu, expulso e massacrado desde antes do nascimento de Jesus. Entre os inúmeros exemplos, um dos mais famosos ocorreu nas olimpíadas de 1972, quando o grupo palestino, Setembro Negro, invadiu as acomodações dos atletas israelenses, matando dois e sequestrando nove, que também morreriam. Basta refletir: é normal que um país tenha que reforçar a segurança de seus atletas por que eles podem ser assassinados em uma olimpíada? 

Ezra Yachin (Foto: Reprodução/Jewish Breaking News)
Ezra Yachin (Foto: Reprodução/Jewish Breaking News)

O israelense tem um lugar no mundo, ao custo de comprar a briga de outras potências, em troca de um pedaço de terra desértico, cheio de rivalidades, onde nunca se conseguiu fazer muita coisa. Seu território é cheio de abrigos contra mísseis, e entre idas à praia, festas ou o trabalho, a população vive sob a tensão de sirenes tocando quando há risco de ataque. 

Violência e medo reavivado pelo Hamas, expressos nas palavras do, hoje, “Senhor Ezra”, aos soldados mais novos: “Apaguem eles, suas famílias, mães e filhos. Esses animais não podem mais viver”. Entre as ironias deste planeta, no lugar conhecido como Terra Santa, tudo é antigo. Até o ódio.

Um Estado, dois países e um problemão

Todos os países árabes daquela parte do mundo formavam o Império Otomano, liderado pela Turquia, e que deixou de existir ao fim da Primeira Guerra Mundial. Desde então, os ingleses passaram a administrar a região da Palestina, mas esgotados pelos custos da Segunda Guerra Mundial, queriam deixar o Oriente Médio. 

Como nada é de graça nesse mundo, dessa necessidade foi elaborada uma solução para outros problemas:

  • Sair de uma área hostil aos seus interesses; 
  • Evitar que o território fosse dominado por rivais, deixando-o sob a responsabilidade de um aliado; 
  • Após o massacre contra os judeus na Europa, atender o desejo do movimento sionista de retornar a Jerusalém.

Nas Organizações das Nações Unidas (ONU), foi apresentada a proposta de divisão da Palestina em dois Estados independentes, ficando com os árabes a maior parte. A ideia era que, se tanto os judeus locais quanto os palestinos lutavam contra o domínio inglês, então o território deveria ser dividido entre os dois, vivendo separados para evitar conflitos. Na prática, quem teria que “dividir a sua casa” não aceitou e quem ganharia um pedaço de terra, topou na hora. 

Sem acordo, houve guerra civil, perdida pelos árabes, e o Estado de Israel foi finalmente fundado. Enfim, criou-se a confusão: é como se a Palestina fosse uma fazenda com muitos problemas, passando a ser administrada pelos ingleses, mas a tarefa era complicada e eles negociaram parte do terreno com um comprador confiável, que pagaria com trabalho. 

Como os antigos donos não aceitam nenhum tipo de negociação além da expulsão dos novos vizinhos, Israel precisou de ajuda externa desde o primeiro dia de sua existência. Essa dependência garante que eles não se voltem contra os interesses ingleses e seu principal aliado, os americanos. 

Sendo assim, quando os Estados Unidos dão apoio incondicional a Israel, na prática, a mensagem é: os Estados Unidos dão apoio incondicional aos interesses dos Estados Unidos, em uma parte do mundo onde ninguém tem simpatia por eles. 

Para ter um lugar para existir, os israelenses precisam fazer esse plano dar certo, enquanto tiram vantagens aqui e ali de sua importância na política externa americana, ao mesmo tempo em que se defendem de ataques de todos lados.

No fim das contas, a Terra Santa é um lugar onde os “novos proprietários” tem a escritura, mas os antigos consideram que a negociação foi sem o seu consentimento. Tragédias como o míssil que matou 500 pessoas em um hospital na Faixa de Gaza são tristes consequências de toda essa novela.

E o Brasil com isso?

O Brasil segue vivendo intensamente o conflito na Terra Santa, mas cada um do seu jeito. Enquanto o deputado estadual Delegado Lucas (PP), criou um projeto para conceder o título de cidadão honorário para Benjamin Netanyahu, uma mulher trazida de Israel em avião da Força Aérea Brasileira (FAB), agradeceu aos esforços do… prefeito de Sorocaba, São Paulo (?!). Ou o caso do Pastor Felippe Valadão, que inventou uma fake news para não agradecer a Lula.

Na maior operação de repatriação do país, o Itamaraty disponibilizou um formulário online, onde os brasileiros de Israel e da Palestina podem manifestar seu interesse de voltar para a sua terra natal, de graça. Isso pode parecer óbvio para a gente, mas não é assim em todo lugar. 

O Reino Unido, por exemplo, está cobrando R$ 1800 pelo resgate de cada britânico. No caso dos americanos, os que fugiram de navio não puderam levar animais de estimação e, antes de embarcar, assinaram uma nota promissória de reembolso ao governo dos Estados Unidos. 

Enfim, há lugares mais ricos nesse mundo, mas lá não tem colher de chá para ninguém.