Rio de Janeiro, 3 de junho de 2025 – Com 33 votos favoráveis, 14 contrários e uma abstenção, a Câmara Municipal do Rio aprovou em primeira votação o Projeto de Lei Complementar 13/2025, que cria uma nova estrutura armada dentro da Guarda Municipal. A proposta, enviada pelo prefeito Eduardo Paes (PSD), muda o nome da corporação para Força de Segurança Municipal (FSM-RIO) e institui a Força de Segurança Armada (FSA), um braço armado e “de elite” da nova guarda. A medida ainda precisa passar por nova votação antes de virar lei.
Apesar do discurso oficial de modernização e reforço da segurança pública, o projeto foi duramente criticado por parlamentares da oposição, que acusam o Executivo de empurrar à força uma proposta sem debate público adequado, com forte viés de militarização urbana e desmonte do serviço público. A criação da FSA prevê o uso de armas de fogo no policiamento ostensivo e comunitário, além de contratações temporárias com gratificações extras para os agentes lotados na nova tropa.
Um novo braço armado sob controle direto do prefeito
O texto estabelece que a FSA será comandada por um diretor-chefe escolhido livremente por Eduardo Paes, o que significa controle político direto sobre a tropa. A proposta garante autonomia funcional ao novo órgão, ainda que vinculado à estrutura da FSM-RIO. A arma usada em serviço deverá ser deixada em local designado após o expediente, mas não há clareza sobre a logística de armazenamento e segurança desses armamentos.
O plano também impede o uso das armas para fins pessoais e limita sua posse ao horário de serviço. Apesar disso, não há garantias de que os agentes terão proteção fora do trabalho, abrindo brechas para situações de retaliação, segundo críticos do projeto.
Contratos temporários e gratificações: o atalho neoliberal na segurança
Um dos pontos mais polêmicos é a possibilidade de contratar agentes por tempo determinado, com contratos de até um ano, renováveis por até cinco vezes. Na prática, isso permite que a prefeitura mantenha uma tropa armada precária e sem vínculo efetivo com o serviço público, enfraquecendo as bases da carreira na Guarda Municipal.
O salário prometido para um agente da FSA é de R$ 13.033, com uma gratificação adicional de R$ 10.283,48 pelo uso de arma de fogo. A tropa poderá ser composta por guardas municipais aprovados em concurso interno. O último concurso para a GM-RIO, no entanto, foi realizado em 2012 e nem todos os aprovados foram convocados.
Votos contrários apontam risco de “higienização social”
Entre os 14 vereadores que votaram contra o projeto, o tom majoritário foi de repúdio à proposta que, segundo eles, não valoriza a Guarda Municipal existente e impõe um modelo de repressão voltado ao controle dos pobres e trabalhadores informais. A vereadora Tainá de Paula (PT), exonerada da Secretaria de Meio Ambiente para participar da votação, alertou que a FSM-RIO pode virar um “aparelho de higienização da cidade”, em referência à perseguição histórica contra camelôs e moradores de rua.
Tainá defendeu a criação de mecanismos de controle social e participação popular, como conselhos cidadanizados. Já Thais Ferreira (PSOL) foi direta: “O único projeto bem-sucedido do prefeito é o de precarização do serviço público”. Para ela, as audiências públicas foram insuficientes e não houve escuta real à base da Guarda.
Câmara tenta manter fachada de diálogo, mas atropela debate
Apesar das críticas, o presidente da Câmara, Carlo Caiado (PSD), disse que o projeto é fruto de “diálogo e transparência”. O líder do governo, Marcio Ribeiro (PSD), prometeu discutir emendas, mas não estabeleceu prazos ou compromissos claros. Até o momento, nenhuma emenda de mérito foi incorporada ao texto.
O placar expôs um cenário curioso: o PL de Carlos Bolsonaro e o PSOL uniram votos contrários à proposta, embora por razões diferentes. O bolsonarista Dr. Rogério Amorim denunciou o caráter improvisado da FSA e questionou onde as armas ficarão acauteladas. Para ele, o projeto destrói a própria Guarda Municipal.
Milhões investidos, mas controle ainda nebuloso
Segundo estimativas da Prefeitura, a reestruturação da FSM-RIO custará R$ 38,2 milhões em 2025, R$ 215,7 milhões em 2026 e R$ 463,2 milhões em 2027. O texto também prevê corregedorias independentes para a FSM-RIO e para a FSA, com poder de investigação e inspeção interna. Mas até agora não foi definido nenhum mecanismo de controle externo ou participação civil.
Ao apostar em uma força armada de elite e precarizada, sem plano concreto de transparência e accountability, a gestão Paes parece flertar com um modelo de segurança pública mais próximo das milícias institucionais do que da cidadania democrática. A segunda votação, ainda sem data marcada, será o próximo teste para esse projeto de cidade armada.