Rio de Janeiro, Brasil – 7 de junho de 2025. Uma festa junina com quadrilhas e brincadeiras infantis na comunidade do Santo Amaro, no Catete, Zona Sul do Rio, terminou em tragédia após uma ação do Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE) deixar um jovem morto e um adolescente ferido.
O evento, organizado por moradores, foi interrompido por uma operação que transformou o arraial em um cenário de guerra. Vídeos mostram crianças fugindo, pais gritando por socorro e moradores em choque.
A vítima: Herus Guimarães Mendes, 24 anos
Herus, um office boy que trabalhava no Centro, foi atingido por dois tiros e não resistiu. O jovem foi levado ao Hospital Glória D’Or, mas morreu antes de passar por cirurgia. Um adolescente de 16 anos também foi baleado e está internado no Hospital Souza Aguiar. Segundo relatos de vizinhos, não havia confronto quando os policiais chegaram. “Foi execução. Não era baile funk, era festa junina com criança dançando quadrilha”, relatou uma moradora em vídeo.
Comunidade denuncia abuso: “Chegaram atirando”
A festa acontecia na madrugada deste sábado (7), com decoração típica, fogueira controlada e presença de dezenas de crianças, segundo moradores. A chegada dos policiais do BOPE, fortemente armados, ocorreu sem aviso. “Eles vieram para matar. Só isso explica o que fizeram”, afirmou Fernando Guimarães, pai de Herus, ao sair do hospital. O vídeo que circula nas redes sociais mostra o momento do pânico: mulheres gritam, crianças correm e tiros ecoam ao fundo.
A comunidade afirma que não houve qualquer tipo de resistência ou atividade criminosa no local durante o evento. “Não tinha baile, não tinha facção armada ali. Era festa junina”, repetem moradores em diversas postagens.
Secretaria de Segurança tenta justificar barricadas
Em nota protocolar, a Secretaria de Segurança Pública do Rio afirmou que a operação visava “retirada de barricadas instaladas por traficantes”. No entanto, não explicou por que o BOPE entrou atirando em uma área com presença massiva de civis, em um evento público e previamente anunciado. A ausência de mandado judicial, a não comunicação prévia à comunidade e o uso de força letal em meio a um evento comunitário reforçam as acusações de abuso.
Entidades de direitos humanos pedem investigação independente. “É mais um caso de violência policial que precisa ser tratado como crime de Estado. Atirar em um arraial popular é cruzar todas as linhas da legalidade”, declarou Beatriz Vargas, da Comissão Justiça e Paz da CNBB.
Rio em militarização: contexto de operações letais
O caso se soma a uma longa lista de operações policiais letais em comunidades do Rio de Janeiro, frequentemente conduzidas sem controle judicial efetivo e com apoio tácito de setores políticos e midiáticos que romantizam o confronto. A militarização da segurança pública carioca – com BOPE, CORE e batalhões especiais – tem provocado sucessivas chacinas, com baixo índice de responsabilização.
Desde 2022, decisões do STF tentam impor limites a esse tipo de operação, como a obrigatoriedade de preservação de escolas e hospitais. No entanto, a letalidade policial no estado segue entre as mais altas do mundo. O uso recorrente do termo “retirada de barricadas” tem servido de escudo discursivo para ações que resultam em mortes sem explicação.
Reação social e institucional
Nas redes, a hashtag #JustiçaPorHerus ganhou força. Parlamentares da oposição, como a deputada estadual Renata Souza (PSOL), pediram o afastamento dos responsáveis e a investigação independente pela Defensoria Pública e pelo Ministério Público. “A guerra às drogas não pode justificar massacres”, declarou.
O governador Cláudio Castro (PL) ainda não se manifestou. Já o BOPE não comentou sobre as imagens divulgadas, tampouco confirmou a presença de supostos traficantes armados na área.
O Carioca Esclarece
Por que o BOPE atua em festas comunitárias? Em tese, não deveria. O BOPE é uma tropa de elite com atuação voltada a situações de alta complexidade. Sua entrada em uma festa junina com crianças revela desvio de finalidade, abuso de poder e possível ilegalidade.
Qual a diferença entre baile funk e festa junina nesse contexto? Baile funk costuma ser usado por autoridades como justificativa para operações policiais, associando-os a supostos “territórios dominados”. No entanto, a criminalização do funk já é denunciada por organismos internacionais como forma de racismo estrutural. Uma festa junina, por seu caráter cultural e familiar, desmonta essa retórica.
Há alguma consequência legal para ações como essa? Em geral, são raras. Casos como o de Herus só geram responsabilização quando há pressão social massiva, provas contundentes e mobilização jurídica articulada. A impunidade policial ainda é regra no Brasil.