BRASÍLIA, BRASIL – 9 de junho de 2025 – O tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, confirmou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que presenciou pessoalmente reuniões em que foi apresentada uma minuta golpista a integrantes das Forças Armadas, com a presença do então presidente.
O depoimento, realizado nesta segunda-feira (9), marca o início da fase de interrogatórios dos réus acusados de arquitetar uma tentativa de ruptura institucional no país.
Sob questionamento do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, Mauro Cid admitiu: “Presenciei grande parte dos fatos, mas não participei deles”. A frase escancara a participação direta de Bolsonaro em articulações para invalidar o resultado das eleições de 2022 e mobilizar setores militares contra a democracia.
Minuta golpista exibida a militares
Durante a oitiva no STF, Mauro Cid relatou que testemunhou a apresentação da minuta de decreto de estado de sítio na biblioteca do Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência. O documento foi projetado em uma tela, na presença de Bolsonaro, de seu então assessor Filipe Martins e de comandantes militares.
Cid detalhou: “A apresentação feita inicialmente foi só da parte dos considerandos, que presenciei porque operava o computador”. A cena descrita é emblemática do uso da estrutura oficial do governo para discutir medidas claramente inconstitucionais, com a anuência do então presidente.
Delação homologada, pressão negada
Cid prestou depoimento na condição de colaborador premiado da Polícia Federal, após fechar um acordo de delação homologado pelo STF. Questionado sobre a legitimidade do processo, ele afirmou que assinou o acordo “por vontade própria” e negou ter sofrido qualquer tipo de coação.
O depoimento reforça a versão apresentada pela PF nas denúncias que apontam a existência de um “núcleo decisório golpista” formado por Bolsonaro e militares da alta cúpula. O grupo teria atuado com o objetivo de deslegitimar o sistema eleitoral, preparar medidas de exceção e pressionar o Alto Comando das Forças Armadas para aderir ao plano.
O “núcleo crucial” do golpismo
Segundo a Procuradoria-Geral da República, Mauro Cid era o “elo logístico” entre Bolsonaro e os demais integrantes da conspiração, servindo como porta-voz informal do ex-presidente. A PGR descreve sua função como a de alguém com “menor autonomia decisória”, mas acesso privilegiado aos bastidores das tratativas.
Cid é o primeiro dos oito réus do chamado “núcleo crucial” a ser interrogado. Os demais — todos militares ou civis de confiança direta de Bolsonaro — serão ouvidos por Alexandre de Moraes na seguinte ordem:
- Alexandre Ramagem (ex-diretor da Abin)
- Almir Garnier (ex-comandante da Marinha)
- Anderson Torres (ex-ministro da Justiça)
- Augusto Heleno (ex-GSI)
- Jair Bolsonaro (ex-presidente)
- Paulo Sérgio Nogueira (ex-comandante do Exército)
- Walter Braga Netto (ex-ministro da Defesa)
A audiência de Jair Bolsonaro será o ponto culminante da série de oitivas, com expectativa de transmissão ao vivo por veículos independentes e pressão de entidades pela responsabilização institucional.
Articulação golpista no coração do poder
O relato de Mauro Cid confirma o que investigações da Polícia Federal, da PGR e de comissões parlamentares vinham mapeando: o epicentro da tentativa de golpe não estava em grupos extremistas marginais, mas sim no próprio gabinete presidencial.
O uso da biblioteca do Palácio da Alvorada para projetar uma minuta inconstitucional a oficiais das Forças Armadas simboliza o grau de normalização da conspiração nos altos escalões. Não se tratava de ideias soltas ou bravatas — era um plano de ação deliberado, testado entre generais, com respaldo de Bolsonaro.
A versão de que o ex-presidente apenas “ouviu” as propostas cai por terra diante do testemunho de Cid e da documentação obtida pela PF, que inclui e-mails, áudios, relatórios e até esboços jurídicos preparados por juristas alinhados ao bolsonarismo.
O Carioca Esclarece
Mauro Cid teve participação ativa no plano de golpe?
A versão oficial da PGR é que Mauro Cid não integrava o núcleo decisório, mas era o operador logístico das ordens de Jair Bolsonaro. No entanto, seu papel foi essencial para o funcionamento da engrenagem golpista.
Bolsonaro pode ser preso com base nesse depoimento?
Depoimentos como o de Mauro Cid, somados a provas documentais e cruzamentos de mensagens, sustentam a denúncia contra Bolsonaro. No entanto, uma eventual prisão depende de decisão judicial após o julgamento do mérito.
Como o STF tem tratado as acusações de tentativa de golpe?
O STF tem adotado uma postura firme diante das provas. Sob relatoria de Alexandre de Moraes, o Supremo autorizou buscas, prisões e quebras de sigilo em diversas fases da investigação. A Corte tem se posicionado como defensora da ordem constitucional.