Paris, França – 7 de junho de 2025
A palavra-chave do encontro foi moralidade. Durante uma reunião simbólica realizada na sexta-feira (6) em Paris, o líder da esquerda francesa, Jean-Luc Mélenchon, agradeceu pessoalmente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva por sua contundente declaração sobre o genocídio em curso na Faixa de Gaza. “Lula é uma grande figura moral da humanidade”, afirmou o veterano político, ao comentar o impacto da fala brasileira no cenário europeu.
O encontro, que durou cerca de uma hora, ocorreu enquanto Lula cumpre agenda oficial na França. A visita tem sido marcada por atos simbólicos de peso, como o uso do lenço palestino recebido de estudantes da Universidade Paris 8 e os discursos enfáticos contra a política de extermínio promovida por Israel.
Denúncia que ecoa
Na quinta-feira (5), ao lado do presidente francês Emmanuel Macron, Lula declarou publicamente que as ações de Israel contra a população de Gaza configuram um genocídio. A fala gerou reações internacionais imediatas, dividindo governos e mobilizando partidos de esquerda em todo o mundo.
Para Mélenchon, a posição do presidente brasileiro é rara entre chefes de Estado de grandes países e representa um gesto de coragem política. “A tomada de posição do presidente do Brasil sobre Gaza nos ajuda enormemente”, disse o líder da França Insubmissa, partido que há anos denuncia os crimes de guerra cometidos por Israel, mas que enfrenta acusações sistemáticas de antissemitismo por parte da mídia e da direita francesa.
Entre Gaza e o Mercosul
Apesar da convergência no apoio à Palestina, o encontro entre Lula e Mélenchon também tratou de divergências. A principal delas diz respeito ao acordo comercial entre Mercosul e União Europeia, que a França, especialmente sua ala progressista, vê com desconfiança. Mélenchon entregou a Lula um relatório com as críticas da esquerda francesa ao pacto, acusando-o de ameaçar a agricultura local e favorecer um modelo extrativista e predatório.

Lula, por sua vez, defendeu o diálogo direto entre agricultores franceses e sul-americanos como uma alternativa à paralisia. A proposta foi recebida com cautela, mas representa uma tentativa de reconciliação diplomática entre o campo e o governo progressista brasileiro.
Amizade, gafe e luta comum
A reunião também teve momentos de descontração. Mélenchon, que visita Lula desde os tempos de prisão em Curitiba, cometeu uma gafe ao cumprimentar o presidente com um “Hola, qué tal?”, em espanhol. A cena foi recebida com bom humor.
Ao lado de Mélenchon, estavam os deputados Aurélie Trouvé e Eric Coquerel, ambos da França Insubmissa e com cargos estratégicos em comissões econômicas. Trouvé declarou-se “honrada” por conhecer Lula e disse se inspirar “em seus combates e ideias”.
Macron entre silêncios e manobras
Enquanto a esquerda francesa saúda a postura de Lula, o presidente Emmanuel Macron continua a praticar uma diplomacia ambígua. Embora tenha endurecido o discurso contra Israel nos últimos meses, Macron recusou-se a usar o termo “genocídio” e afirmou que tal classificação caberia aos “historiadores”.
A hesitação revela o impasse europeu diante da pressão crescente da opinião pública e dos aliados da OTAN. O silêncio de Macron contrasta com a contundência de Lula e expõe a dificuldade das potências ocidentais em romper com Israel, mesmo diante de massacres sistemáticos.
O Carioca Esclarece
Por que a fala de Lula sobre Gaza é considerada histórica?
Porque poucos líderes do G20 ousaram usar o termo “genocídio” publicamente. A fala rompe o consenso diplomático e alinha o Brasil com países do Sul Global que denunciam o massacre em Gaza desde 2023.
Mélenchon é realmente isolado na França?
Sim. Embora tenha expressiva base social, Mélenchon enfrenta resistências do centro e da direita. Sua firme defesa da Palestina é usada como pretexto para atacá-lo com acusações de antissemitismo.
O acordo Mercosul-UE está ameaçado?
Sim. A oposição francesa — tanto da esquerda quanto do agronegócio — tem sido um obstáculo. A proposta de Lula de abrir diálogo entre agricultores pode destravar negociações, mas enfrenta resistência cultural e econômica.