30 de maio de 2025 – Washington, Estados Unidos
A Suprema Corte dos Estados Unidos autorizou nesta sexta-feira (30) o governo de Donald Trump a cancelar o visto temporário de mais de 500 mil imigrantes, medida que abre caminho para uma deportação em massa sem precedentes. A decisão do tribunal, tomada de forma opaca e com fundamentação lacônica, escancara a guinada autoritária da política migratória sob o novo mandato do republicano e desmonta um dos últimos pilares da política humanitária implementada por Joe Biden.
Venezuelanos, haitianos, cubanos e nicaraguenses — cidadãos forçados ao exílio por perseguições políticas, colapsos econômicos e regimes violentos — perdem, a partir de agora, qualquer respaldo legal para permanecer nos Estados Unidos. O impacto recai diretamente sobre comunidades já historicamente marginalizadas pelo sistema migratório norte-americano, consolidando uma política de criminalização da pobreza e da migração.
Ataque legal à proteção humanitária
O programa de vistos temporários, instituído em 2022 por Joe Biden, oferecia uma rota legal e segura para cidadãos de países em crise entrarem nos Estados Unidos com autorização provisória para viver e trabalhar. Os beneficiários precisavam apresentar um patrocinador nos EUA e comprometer-se a entrar no país exclusivamente por via aérea. A iniciativa visava reduzir a migração irregular pela fronteira sul e oferecer alternativas diante da escalada repressiva em nações como Venezuela, Cuba e Nicarágua.
A iniciativa, no entanto, colidia diretamente com a retórica xenofóbica da extrema-direita estadunidense. Desde sua volta ao poder, Donald Trump tem desmantelado sistematicamente os dispositivos legais que protegiam migrantes em situação de vulnerabilidade, sob o pretexto de “restabelecer o controle das fronteiras”. Em março, a Casa Branca anunciou a revogação do programa — decisão contestada judicialmente até o veredito de hoje.
Decisão opaca e sem transparência
A Suprema Corte não apresentou justificativas detalhadas para a decisão. O placar da votação também foi mantido sob sigilo, com apenas duas magistradas — ambas mulheres — registrando voto contrário. A ausência de motivação explícita por parte da mais alta instância judicial dos Estados Unidos revela um preocupante esvaziamento do debate jurídico e reforça a percepção de que a Corte atua como correia de transmissão da agenda radical trumpista.
O argumento central do Departamento de Justiça, representando a Casa Branca, foi o de que o programa de vistos temporários era incompatível com a política migratória da atual administração, que pretende desfazer as “decisões democráticas” das eleições de 2020 — uma retórica que revela não apenas a disposição revisionista do governo Trump, mas seu desprezo pela continuidade institucional e pela proteção de minorias.
Deportações aceleradas, risco de morte
Organizações de defesa dos imigrantes e advogados de direitos humanos já alertam para o risco imediato de perseguição e morte que os deportados poderão enfrentar. “A revogação do programa causará danos irreparáveis”, alertaram representantes legais em petição à Suprema Corte, ressaltando que muitos dos afetados são alvos conhecidos de regimes autoritários ou vivem em contextos de violência endêmica.
O mecanismo da liberdade condicional humanitária, que embasava a legalidade do visto temporário, será descontinuado. Isso implica a suspensão indefinida de processos de asilo, o que empurra milhares de famílias para um limbo jurídico e as expõe à deportação sumária. Com a decisão, esses imigrantes perdem o direito de se defender no devido processo legal, uma garantia básica da democracia que os Estados Unidos tanto se orgulham de pregar ao redor do mundo.
EUA aprofundam política de exclusão racial e classista
A medida atinge desproporcionalmente imigrantes latino-americanos e caribenhos, escancarando o viés racializado e classista que estrutura a política migratória dos Estados Unidos. O discurso da “ordem nas fronteiras” serve, mais uma vez, como cortina de fumaça para um projeto de exclusão institucionalizada, que vê o imigrante pobre como inimigo e transforma o direito de migrar em privilégio branco.
Com a decisão da Suprema Corte, Donald Trump reforça a narrativa do “cerco ao invasor”, típica do populismo autoritário que o impulsionou à Casa Branca. A instrumentalização do Judiciário para validar essa retórica — mesmo sem argumentação pública ou transparência — é um sinal alarmante de degradação democrática nos Estados Unidos.
Cenário eleitoral e militarização da migração
A revogação dos vistos temporários ocorre num momento de crescente tensão política nos Estados Unidos, às vésperas das eleições legislativas de novembro. O tema da imigração tornou-se peça central da estratégia trumpista para mobilizar sua base, em consonância com o aparato repressivo da Immigration and Customs Enforcement (ICE), que deve intensificar operações de remoção nos próximos meses.
Especialistas alertam que a combinação entre radicalização retórica, judicialização seletiva e repressão institucional sinaliza não apenas uma nova fase do governo Trump, mas o avanço de uma governança autoritária transnacional, que se alimenta da desinformação, do medo e da exclusão de populações periféricas.
Enquanto isso, milhares de famílias latino-americanas vivem, neste exato momento, sob o espectro da deportação sumária — sem aviso, sem defesa, sem direito ao refúgio.