Rio de Janeiro, 3 de junho de 2025 – Em um Brasil onde a asfixia orçamentária virou política de Estado contra a educação pública, a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) subverteu a lógica da decadência imposta e subiu no ranking global do Center for World University Rankings (CWUR). A instituição carioca avançou da 401ª para a 331ª posição entre mais de 20 mil universidades analisadas no mundo, ultrapassando a Universidade de São Paulo (USP) em critérios cruciais como qualidade da educação e do corpo docente. A façanha, no entanto, escancara uma contradição brutal: como pode uma universidade sem climatização, com goteiras e elevadores parados, seguir entre as melhores do mundo?
Excelência à margem do abandono
A UFRJ não melhorou graças a investimentos robustos — ela sobrevive apesar deles. Enquanto 87% das universidades brasileiras perderam posições no ranking de 2025, a UFRJ se destacou em indicadores de impacto como a qualidade da educação, onde apareceu em 504º lugar, superando a USP, que ficou em 538º. Na qualificação do corpo docente, o salto foi ainda mais expressivo: 176ª posição mundial, frente à 190ª da paulista.
Mas esse avanço está longe de significar estabilidade. A universidade acumula anos de sucateamento crônico — marca registrada do projeto de desmonte iniciado com o golpe de 2016 e radicalizado durante o governo de Jair Bolsonaro. Prédios interditados, salas mofadas, cortes em bolsas e um orçamento engessado mostram que a excelência da UFRJ não se deve à política pública vigente, mas à resiliência da comunidade acadêmica que insiste em resistir.
A equação perversa da pesquisa
Se a UFRJ se destacou em educação e corpo docente, ficou para trás em pesquisa — justamente o item que mais pesa na nota final do CWUR, com 40% de peso. A USP, nesse aspecto, ocupa a 81ª posição global; a UFRJ, a 393ª. O abismo é proporcional ao investimento desigual. Como lembrou o reitor Roberto Medronho, a verba da universidade é majoritariamente consumida pelo pagamento de servidores, aposentados e pensionistas, restando migalhas para a produção de ciência.
“O que seria da UFRJ com um orçamento minimamente adequado?”, provoca Medronho, com razão. A universidade não pede milagres, mas o mínimo para operar. E esse mínimo vem sendo negado com sistemática perversidade por sucessivos governos, que privilegiam incentivos bilionários a empresas enquanto universidades se equilibram entre o colapso e a resistência.
Federal de segunda, excelência de primeira
A UFRJ é a segunda maior universidade pública do Brasil, com uma história de excelência em áreas estratégicas como engenharia, saúde, petróleo e artes. Instituições como a Coppe/UFRJ foram fundamentais para a construção da Petrobras e para a liderança brasileira em águas profundas. Mesmo assim, a estrutura física da universidade é descrita como medieval por estudantes e docentes.
“É nosso sonho de consumo ter o orçamento que as universidades paulistas têm. O nosso é federal, engessado, insuficiente”, afirmou Medronho. Como alternativa, ele negocia com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação para ampliar o acesso da UFRJ ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) — uma tentativa de manter viva a chama da pesquisa diante da escassez.
Um país que despreza seus cérebros
O paradoxo não escapa ao olhar crítico de quem vive a realidade por dentro. Para Mauro Osório, professor e representante do Fórum de Reitores das Instituições Públicas de Educação do Rio de Janeiro (Friperj), o quadro é inaceitável. “Não faz sentido ter R$ 800 bilhões em incentivos fiscais e deixar as universidades nesse estado”, denuncia.
A crítica é direta ao modelo econômico que recompensa grandes empresas com isenções enquanto asfixia o ensino público. O resultado? Um país que forma cérebros brilhantes em condições precárias, mas que não oferece meios para retê-los ou valorizá-los.
Estudantes entre o orgulho e o desalento
A estudante Arthura dos Santos, do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (Ifics), resume bem o sentimento contraditório que percorre os corredores da UFRJ: orgulho pela excelência, frustração com o abandono. “Falta orçamento. Melhoramos no acesso, mas ainda são poucos os que conseguem se manter. A assistência estudantil é fundamental”, afirma.
O que está em jogo não é apenas a posição da UFRJ em um ranking global, mas o próprio futuro da educação pública no Brasil. A universidade provou que ainda é possível figurar entre as melhores do mundo. Mas até quando a resiliência será suficiente?
Enquanto o Brasil não resolver sua relação doentia com a educação pública, universidades como a UFRJ seguirão sendo milagres estatísticos em meio ao caos — e isso não é sustentável. Uma nação que desvaloriza suas universidades compromete sua soberania, sua economia e sua democracia.