Brasília, Brasil – 7 de junho de 2025 – A Organização das Nações Unidas (ONU) recomendou formalmente que o governo brasileiro proíba o modelo de escolas cívico-militares, adotado por diversos estados e municípios nos últimos anos.
A posição foi registrada no relatório da Revisão Periódica Universal (RPU), mecanismo que avalia a situação dos direitos humanos nos países-membros a cada quatro anos e meio. A recomendação explícita para eliminar a militarização no ensino público recoloca o Brasil sob os holofotes internacionais no que diz respeito à proteção da infância e juventude.
A medida ocorre após denúncia feita por parlamentares do PSOL-SP, que apontaram à ONU os efeitos nocivos do programa implantado em São Paulo pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). O caso agora se insere num dossiê mais amplo, no qual a ONU também denuncia violência policial sistemática, discriminação racial estrutural e vulnerabilidades digitais que afetam crianças brasileiras.
Denúncia internacional contra a militarização educacional
O modelo de escolas cívico-militares, iniciado em larga escala durante o governo Jair Bolsonaro e mantido por figuras da nova direita como Tarcísio de Freitas, voltou a ser alvo de críticas no cenário internacional. Segundo o relatório da ONU, a militarização do ambiente escolar fere princípios básicos dos direitos da criança, impondo práticas disciplinares autoritárias, códigos de conduta rígidos e presença ostensiva de militares armados nos espaços de aprendizagem.
A queixa enviada ao Comitê da ONU foi assinada pelos deputados Luciene Cavalcante, Celso Giannazi e Carlos Giannazi, do PSOL paulista. Eles argumentam que o modelo viola o direito à educação plural e democrática, além de produzir exclusão simbólica e disciplinar de jovens periféricos, especialmente negros. Em São Paulo, a política foi institucionalizada por meio de lei complementar, o que dificulta sua reversão sem enfrentamento legislativo.
A ONU aponta o elo entre militarismo escolar e violência de Estado
O Comitê de Direitos da Criança da ONU não se limitou à crítica educacional. Em seu parecer, a entidade manifesta “profunda preocupação” com a violência sistemática contra crianças no Brasil, sobretudo nas áreas pobres e racializadas. O relatório destaca que há uma conexão direta entre a lógica militar nas escolas e a cultura de repressão estatal nas favelas, onde operações policiais resultam em mortes e desaparecimentos de menores.
A ONU cobra investigações independentes sobre esses episódios, divulgação pública dos dados e responsabilização dos agentes do Estado. A entidade também classificou como alarmante a ausência de mecanismos eficazes de proteção à infância nas periferias, onde o mesmo Estado que impõe disciplina militar às escolas é também o responsável por massacres e abusos nas ruas.
Proteção digital e combate à exploração infantil
Outro ponto importante do relatório é a exigência de que o Brasil reforce imediatamente a legislação sobre proteção de dados pessoais de crianças, proibindo o uso desses dados em sistemas de inteligência artificial. A ONU defende a aprovação urgente de um projeto de lei que regule conteúdos pornográficos produzidos por IA e impede o uso abusivo da imagem de menores em ambientes digitais manipulados.
A entidade também alertou para a necessidade de critérios mais rigorosos no processo de adoção, a fim de combater o tráfico infantil e as adoções ilegais disfarçadas de ações humanitárias. O Brasil, segundo o Comitê, está falhando em garantir segurança institucional às crianças, especialmente nas fronteiras e nos sistemas judiciais.
Escolas cívico-militares como projeto ideológico
A crítica da ONU acerta em cheio um dos pilares ideológicos do bolsonarismo e seus herdeiros. O modelo cívico-militar se vende como solução para a “indisciplina” escolar, mas silencia sobre os efeitos psicológicos e pedagógicos de uma educação baseada na obediência cega e no medo. Ao contrário do discurso meritocrático, o formato é aplicado de forma seletiva: quase sempre em bairros de maioria negra, pobre e periférica.
Ao institucionalizar a presença militar em escolas públicas, o Estado brasileiro desloca recursos da educação para forças de segurança, enfraquece os conselhos escolares e substitui o papel pedagógico por uma lógica de vigilância e punição. A crítica internacional evidencia que o Brasil está na contramão de países que valorizam educação crítica, plural e livre de coerção militar.
O Carioca Esclarece
Por que a ONU quer o fim das escolas cívico-militares no Brasil?
Porque o modelo viola os princípios da Convenção sobre os Direitos da Criança, promovendo repressão institucional em vez de aprendizagem. A ONU vê essa prática como forma de normalização da presença militar na vida civil, o que contraria tratados assinados pelo Brasil.
O que diz Tarcísio de Freitas sobre a recomendação?
Até o momento, o governador não comentou oficialmente a recomendação da ONU. No entanto, ele segue defendendo o programa como resposta à “crise de autoridade” nas escolas, o que revela uma adesão ideológica à militarização da infância.
A recomendação da ONU é obrigatória?
Não é vinculante, mas tem peso político e simbólico. Pode ser usada por movimentos sociais e parlamentares para pressionar o Congresso, o Supremo Tribunal Federal e o Ministério da Educação a reverem ou barrar o avanço do modelo militarizado.