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Identidade Oculta

Os sobrenomes mais comuns do Brasil

Ranking dos nomes mais comuns do Brasil revela heranças da escravidão, apagamentos e marcas da colonização portuguesa

BRASÍLIA, BRASIL – 8 de junho de 2025 – Um simples sobrenome pode carregar séculos de imposição, apagamento e resistência.

Um levantamento da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil) revelou os 10 sobrenomes mais comuns do Brasil — uma lista que, à primeira vista, parece apenas estatística, mas que, sob análise crítica, escancara o peso da colonização portuguesa, da escravidão e do catolicismo na formação da identidade civil brasileira.

Silva, Santos, Oliveira, Souza, Pereira, Ferreira, Rodrigues, Alves, Lima e Costa: nomes repetidos milhões de vezes em certidões de nascimento, identidade, CPF e diplomas. Mas o que eles revelam — ou ocultam — sobre quem os carrega?


Apagamentos forçados e sobrenomes genéricos

O sobrenome Silva, o mais comum do país, tem origem latina (silva, floresta), mas seu uso no Brasil está profundamente ligado ao apagamento de identidades indígenas e africanas. Durante os séculos de colonização e escravidão, pessoas escravizadas eram privadas de seus nomes de origem e registradas com sobrenomes genéricos atribuídos por senhores de escravos, padres ou funcionários coloniais.

Silva, Santos, Souza e Oliveira eram amplamente usados como rótulos de registro civil e batismo, sem qualquer relação genealógica real. Dessa forma, o Estado colonial português impôs uma identidade civil artificial a milhões de brasileiros, apagando línguas, linhagens e histórias familiares.

Segundo historiadores como Lilia Schwarcz, o uso repetido desses sobrenomes reflete um processo violento de homogeneização cultural. “Chamamos de Silva o que não sabíamos nomear, e isso diz muito sobre o nosso projeto de Nação”, afirma.


A religião como matriz registral

Outro sobrenome entre os mais frequentes, Santos, é símbolo da religiosidade católica compulsória que moldou o Brasil desde o século XVI. Em muitos casos, crianças eram registradas com esse sobrenome quando nascidas no Dia de Todos os Santos (1º de novembro), ou simplesmente como um “ato de devoção” de famílias pobres e devotas.

Não por acaso, os arquivos paroquiais mostram uma explosão do nome Santos em populações indígenas aldeadas e em descendentes de africanos, batizados sob a tutela da Igreja Católica. A função dos sobrenomes era menos genealógica e mais doutrinária: quem era “de Santos” estava, teoricamente, salvo para o Reino dos Céus — e obediente à ordem colonial.


A falsa ideia de origem europeia

Apesar da aparência ibérica, a maioria dos sobrenomes mais comuns do Brasil não indica origem portuguesa real. Poucos brasileiros descendem diretamente de famílias nobres ou rurais da Península Ibérica. A vasta repetição desses nomes vem de processos de atribuição forçada, não de herança familiar legítima.

Pereira, por exemplo, era um sobrenome dado por tabeliães a ex-escravizados ou agregados sem ascendência conhecida. O mesmo ocorre com Rodrigues, Ferreira e Alves. Esses nomes seguiam modelos de “portugalização” de sujeitos racializados, especialmente após a abolição formal da escravidão em 1888.

Hoje, esses sobrenomes cruzam todas as classes sociais, mas mantêm — silenciosamente — a marca do Brasil colonial. Mesmo famílias brancas que ostentam um “Souza” ou “Costa” nem sempre sabem que carregam, na certidão, o traço burocrático de uma sociedade escravocrata.


Diversidade silenciada nos registros

A presença quase absoluta de sobrenomes portugueses entre os mais comuns também evidencia a exclusão sistemática de outros sistemas de nomeação. Nomes indígenas, africanos, árabes ou asiáticos foram perseguidos, corrompidos ou proibidos ao longo da história do registro civil brasileiro.

No entanto, o Brasil não é homogêneo. Povos originários como os Guarani, Tikuna e Yanomami têm suas próprias tradições onomásticas, frequentemente ignoradas ou distorcidas pelo sistema oficial. Da mesma forma, comunidades negras quilombolas lutam para preservar nomes ancestrais apagados ou transformados pela lógica do cartório colonial.

O que os dados da Arpen-Brasil revelam, portanto, é menos sobre os sobrenomes em si — e mais sobre a violência burocrática de um país que nomeou para dominar.


O Carioca Esclarece

1. Ter um sobrenome comum indica origem portuguesa?
Não necessariamente. Sobrenomes como Silva, Santos ou Souza foram usados em massa por razões religiosas ou burocráticas, não por laços familiares com portugueses. Muitos afrodescendentes e indígenas receberam esses nomes de forma arbitrária durante registros coloniais e eclesiásticos.

2. É possível recuperar sobrenomes apagados pela escravidão?
Em alguns casos, sim. Há movimentos de retomada de identidades ancestrais, especialmente em comunidades quilombolas e indígenas. No entanto, o apagamento sistemático dificulta a reconstrução genealógica, já que os registros históricos foram destruídos, omitidos ou distorcidos.

3. O sistema de registro brasileiro ainda é excludente?
Sim. Embora mais inclusivo que no passado, o sistema ainda privilegia modelos ocidentais de nomeação. Povos indígenas, por exemplo, enfrentam barreiras legais para registrar nomes tradicionais. O mesmo vale para sobrenomes de origem africana, frequentemente vistos como “estranhos” pelos cartórios.

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