Brasília, Brasil – 9 de junho de 2025
O ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, abre nesta segunda-feira (9) a primeira sessão de depoimentos do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a tentativa de golpe de Estado articulada pelo entorno do ex-presidente após sua derrota nas eleições de 2022. Sob os olhos atentos da Primeira Turma do Supremo, Cid prestará depoimento presencial como colaborador premiado em um julgamento que promete destrinchar a rede de militares e civis envolvida no plano golpista.
A palavra-chave “golpe de Estado” não é mais uma suposição jurídica, mas o ponto central de um processo que envolve diretamente Jair Bolsonaro, Walter Braga Netto, Alexandre Ramagem e Augusto Heleno, além de outros nomes da cúpula militar e da Polícia Federal. A delação homologada por Alexandre de Moraes em 2023 é o fio condutor do inquérito, e Mauro Cid será chamado a confirmar – ou desmentir – os detalhes do que entregou.
O operador entre Bolsonaro e os quartéis
Nos documentos da Procuradoria-Geral da República (PGR), Mauro Cid é descrito como mais do que um assessor de confiança: ele seria o intermediário logístico e político entre o ex-presidente e o núcleo que planejava reverter o resultado das urnas. Entre os episódios relatados estão reuniões com generais no Forte Apache, propostas de decretação do Estado de Defesa e discussões sobre o uso da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) para legitimar uma ruptura institucional.
Nas palavras da PGR, Cid “servia como correia de transmissão das intenções golpistas de Jair Bolsonaro”. Em outras palavras, ele era o elo entre a presidência e a caserna. O próprio Cid, contudo, tenta suavizar sua responsabilidade, alegando que apenas seguia ordens de superiores hierárquicos. A defesa tenta construir a imagem de um militar disciplinado, não de um conspirador.
Contradições, Braga Netto e o risco de anulação
O depoimento desta segunda-feira ocorre sob a sombra das contradições acumuladas por Cid desde o início de sua colaboração. A Polícia Federal apontou divergências entre versões dadas em diferentes momentos — especialmente sobre a presença de Braga Netto em reuniões e um pedido de R$ 100 mil em espécie, cuja origem permanece obscura.
Mesmo com os relatos instáveis, Alexandre de Moraes decidiu manter os benefícios da delação, alegando que o conjunto das informações ainda contribui de forma decisiva para a elucidação do golpe. Já o ministro Luiz Fux externou reservas sobre a confiabilidade do depoente, o que aumenta a tensão política e jurídica sobre o julgamento.
A sessão será realizada em um plenário adaptado para receber os oito réus — incluindo nomes centrais como Bolsonaro, Ramagem e Heleno — enquanto Braga Netto participará por videoconferência. Todos terão direito a interpelar diretamente Mauro Cid, e seus advogados devem explorar ao máximo as falhas da delação para minar a acusação.
STF mira nas engrenagens do golpe bolsonarista
O depoimento de Mauro Cid tem um valor que ultrapassa o caso individual. Ele inaugura uma fase pública e processual de exposição das engrenagens golpistas que operaram nos bastidores do poder, ainda sob o manto da legalidade formal. O STF quer deixar claro que houve um plano, que ele foi arquitetado com método e que os autores não se restringem a “loucos isolados”, como tentou alegar a defesa de Bolsonaro.
A estratégia do Supremo, liderada por Moraes, é desmembrar o caso em blocos narrativos: quem planejou, quem executou, quem omitiu. Cid se insere no primeiro grupo, como facilitador do diálogo entre os generais e o ex-presidente. E é justamente por isso que seu depoimento sustenta a espinha dorsal da denúncia.
O Carioca Esclarece
Por que o depoimento de Mauro Cid é considerado decisivo?
Porque ele é o principal elo entre Jair Bolsonaro e os militares envolvidos. Sua delação é a base da acusação formal de tentativa de golpe de Estado. Sem seu depoimento, a tese da PGR perde consistência estrutural.
As contradições de Cid podem anular sua delação?
Não necessariamente. A jurisprudência brasileira permite que delações com contradições sejam mantidas, desde que os elementos principais se confirmem com outras provas. Moraes decidiu manter os benefícios da colaboração, mesmo com divergências.
Braga Netto está diretamente envolvido no planejamento do golpe?
Segundo Cid, sim. Ele relata que Braga Netto participou de reuniões estratégicas e autorizou operações financeiras suspeitas. A defesa do general nega tudo e tenta descredibilizar Cid, mas os elementos contra ele estão sendo reforçados com novas quebras de sigilo.