Brasília – Em um gesto raro — e necessário — o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou, nesta quarta-feira (28 de maio de 2025), uma lista feminina TSE, composta exclusivamente por advogadas, para preenchimento de vaga no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A iniciativa, arquitetada por ninguém menos que Cármen Lúcia, presidente da Corte Eleitoral, é uma resposta direta à histórica exclusão das mulheres dos espaços de decisão no Judiciário — e, por tabela, um lembrete ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva: ou nomeia uma mulher, ou repete a farra da toga masculina.
Representatividade em pauta, finalmente
Enquanto parte do Judiciário ainda recita mantras em latim para justificar sua paralisia estrutural, Cármen Lúcia decidiu agir. Ao invés de submeter uma lista sêxtupla genérica, optou por dividir em duas listas tríplices, sendo uma exclusivamente feminina. O objetivo: garantir que ao menos uma cadeira no TSE, em 2026, esteja ocupada por uma mulher — o que, diga-se de passagem, não aconteceria caso a lógica masculina reinante seguisse seu curso.
A lista aprovada pelo STF inclui os nomes de Cristina Maria Gama Neves da Silva, Estela Aranha e Vera Lúcia Araújo. Vera, aliás, já atua como ministra substituta do TSE e tem trajetória conhecida na defesa dos Direitos Humanos. Estela Aranha passou pelo Ministério da Justiça como secretária de Direitos Digitais na gestão de Flávio Dino. E Cristina Gama é desembargadora no Tribunal Regional Eleitoral do DF. Currículos robustos, para quem ainda acha que gênero é critério de desqualificação.
Mulheres contra o tempo eleitoral
O calendário explica a pressa. Com a aproximação das eleições gerais de 2026, a Corte Eleitoral vive uma dança de cadeiras. Cármen Lúcia e Isabel Gallotti (do STJ) deixam seus cargos em agosto de 2026. Com a saída das duas, somada ao fim dos mandatos de André Ramos Tavares e Floriano de Azevedo Marques — ambos indicados pela advocacia —, o risco de um TSE dominado exclusivamente por homens era mais do que real. Era previsível.
Ao forçar a formação de uma lista feminina, Cármen escancarou essa possibilidade e jogou a batata quente no colo de Lula, responsável por fazer a escolha final entre os nomes enviados.
O ritual da nomeação: forma e conteúdo
O processo é burocrático, mas cheio de armadilhas políticas. Primeiro, o STF aprova os nomes (como fez hoje). Depois, o presidente da República indica um dos três para ocupar a vaga. Simples? Só na teoria. O movimento de Cármen, ao apresentar duas listas separadas (uma masculina, outra feminina), visa justamente escapar da prática costumeira de ignorar candidaturas femininas em nome de um suposto “mérito neutro” — que quase sempre acaba premiando toga, terno e testosterona.
A outra lista aprovada hoje, com nomes de homens, inclui os próprios Tavares e Marques, além de José Levi do Amaral — este último mais conhecido pela fidelidade burocrática do que por qualquer ousadia jurídica.
O recado é claro: ou entra mulher, ou repete-se o clube do Bolinha jurídico.
Repercussão e contexto
A decisão tem gerado debate no meio jurídico e político. Para entidades de defesa dos direitos das mulheres, a medida é um passo importante — ainda que tardio — na democratização da Justiça Eleitoral. Para os críticos de sempre, trata-se de “identitarismo” ou “quota de gênero”. Como se o Judiciário brasileiro não estivesse lotado de homens brancos indicados por apadrinhamento político.
Enquanto isso, Cármen Lúcia segue deixando sua marca. Depois de anos de atuação firme em pautas democráticas — e enfrentamentos com o bolsonarismo —, a ministra reforça, nos últimos meses de sua trajetória no TSE, que representatividade não é ornamento. É urgência institucional.
O Carioca esclarece
Quem são as advogadas indicadas por Cármen Lúcia? Cristina Maria Gama atua no TRE-DF, Estela Aranha foi secretária no Ministério da Justiça e Vera Lúcia Araújo é ministra substituta do TSE.
Por que uma lista feminina no TSE? Para evitar a composição exclusivamente masculina na Corte durante as eleições de 2026.
Quais as consequências da medida? Ela pressiona o Executivo a nomear ao menos uma mulher e abre precedentes para mudanças futuras no Judiciário.
Como isso afeta a democracia? Mais vozes femininas na Justiça Eleitoral ampliam a pluralidade institucional e a sensibilidade jurídica sobre temas sociais relevantes.